A AIESEC é uma organização não governamental e sem fins lucrativos administrada inteiramente por jovens e para jovens. Mais do que isso, é uma plataforma para jovens desenvolverem o seu potencial de liderança por meio de estágios internacionais e oportunidades de voluntariado. Hoje temos connosco a Inês Ferreira que é a presidente da AIESEC em Coimbra para nos falar um pouco melhor desta organização.
Para quem não conhece a organização e a sua forma de trabalhar, explica-nos um pouco melhor em que é que consiste e o que tu fazes em concreto.
Como tu referiste nós desenvolvemos características de liderança nos nossos jovens através de experiências de voluntariado ou de estágios, ou mesmo através de membresia. A nível de membros enquanto organização nós acompanhamos todo o processo que as pessoas que querem fazer um voluntariado ou um estágio têm de fazer quando se estão a candidatar a uma destas oportunidades, a partir do momento que as pessoas se inscrevem na nossa plataforma, aiesec.org. Primeiramente nós fazemos uma sessão de informação para explicar um bocadinho do que nós somos, em que é que consiste a nossa organização, e mostramos oportunidades tendo em conta o que a pessoa pretende. Se forem estágios nós temos dois tipos de estágio, o de curta e o de longa duração, se quiser voluntariado mostramos um bocadinho quais são as nossas parcerias. Fazemos como um match entre os interesses da pessoa e as oportunidades que temos para oferecer. Depois acompanhamos todo o processo de candidatura, na parte dos estágios inclusivamente vemos o CV com a pessoa para tentar melhorar sempre um bocadinho o currículo já que se está a candidatar a uma Start Up ou a uma empresa, na maioria das vezes multinacional. No caso do voluntariado é ligeiramente mais fácil, não é preciso tantos requisitos, mas ajudamos no acompanhamento e mesmo depois de ser aceite na experiência nós ajudamos em toda a logística, com coisas como a melhor altura para comprar bilhetes de avião ou do seguro de saúde ou da consulta do viajante. Quando a pessoa vai de experiência nós também acompanhamos sempre. Todas as semanas nós temos um acompanhamento personalizado e quando a pessoa vem também temos uma reunião final para ver como correu a experiência, para saber se a pessoa se acabou por desenvolver ou não, normalmente sim. Todo o nosso trabalho é resumido a este acompanhamento do processo desde a inscrição até regressar da experiência.
E nós temos que entrar na organização para ir de voluntariado ou de estágio?
Não, qualquer pessoa pode ir de estágio ou de voluntariado desde que tenha entre os 18 e os 30 anos, que é o que nós consideramos população jovem.
Então e a ti o que te fez entrar na AIESEC?
Eu queria imenso fazer voluntariado e foi mais isso que me fez entrar na organização. Tal como eu disse, não que se tenha de pertencer à organização para ir, mas eu quis um bocadinho para conhecer a organização em si, para perceber como é que acontecem todos os processos. Depois eu até fui alocada a uma das área de estágio, porque nós no recrutamento tendo em conta as características, valores e ambições das pessoas decidimos para que área devem ir para começar. Mais tarde, surgiu a experiência de voluntariado e eu fui. Foi muito pelo querer ir, era quase uma paixão desde o secundário que eu tinha de ir de voluntariado e como eu estudei na faculdade de economia, e como a sede da AIESEC em Coimbra é lá, vi nesta organização um modo de conseguir. Depois como conhecia a organização, como eu estava um pouco por dentro de todo o processo decidi ir de experiência em 2019.
A AIESEC é muito conhecida pelo voluntariado! Que opções de voluntariado e estágios internacionais têm e como funcionam?
Na nossa plataforma tu fazes a tua inscrição, de acordo com o que tens interesse em fazer. Passado 24 horas a equipa responsável por essa área liga-te e depois marcam uma reunião, falam da organização mostram as experiências que temos para oferecer, ou seja, os nossos estágios ou os nossos voluntariados e as nossas parcerias de acordo com o que a pessoa quiser. É muito simples e não existe nenhum compromisso, ou seja, não é por a pessoa se estar a inscrever que quer ir ou que vai. Às vezes é só para conhecer um bocadinho e por isso é que nós aconselhamos sempre a ir pelo menos à reunião e depois, se quiser, avançar com o processo nós acompanhamos.
Então se eu me quiser inscrever agora em voluntariado para ir no verão, por exemplo, ainda consigo?
Sim, o processo de voluntariado é relativamente rápido. Para te contextualizar, na altura eu inscrevi-me muito cedo para tratar de tudo com calma, mas eu inscrevi-me num sábado e na segunda-feira eu já estava a ser aprovada e a assinar contrato. Mas quanto mais tarde uma pessoa se inscreve mais caros também ficam os voos, acho que é só isso que fica mais caro se for mais tarde porque a nível de seguro de saúde e seguro de viagem os preços não alteram muito tendo em conta a distância que falta da viagem. A nível de estágios, o processo é ligeiramente mais longo, mas estágios é mais fácil encontrares nesta altura, porque há muitas oportunidades a abrir para daqui a um mês. Em voluntariado isso acontece, mas muito menos e mais a longo prazo.
Para quem quer ir e tem receio com a parte burocrática, como vocês já estão habituados a lidar com isso, ajudam nessa parte?
Sim. Todos os custos são da própria pessoa, a organização não paga nada porque somos uma organização sem fins lucrativos, mas tudo o que for na logística nós ajudamos e acompanhamos. O passaporte, por exemplo, não é necessário comprar muito antes porque tem validade e só estamos a perder. Com os voos nós já temos uma noção de quando estão mais baratos e também indicamos isso.
Um dos benefícios de fazer esta experiência com a AIESEC é a acomodação porque eles dão o pequeno-almoço, o almoço ou o jantar. Em termos da alimentação já varia de projeto para projeto, o meu por acaso não dava a alimentação.
Até onde já foste ou o que é que já fizeste através desta organização. Vi que já foste para a Turquia, certo? Conta-nos um pouco da tua experiência.
Eu ainda só fiz voluntariado, estágio é uma coisa que quero fazer mas ainda não posso porque sou presidente. No voluntariado, eu estive 6 semanas na Turquia, a trabalhar em prol da STG4. Neste caso, de acordo com o objetivo de desenvolvimento sustentável 4, que é sobre a qualidade da educação e que está muito relacionado com os objetivos da ONU. O objetivo era ensinar inglês a adolescentes, entre os 13 e os 18 anos, só que não era o inglês básico de ensinar as cores ou os números. No meu projeto nós eramos cerca de 15 culturas diferentes, cerca de 30 voluntários de 15 países diferentes em que o método de ensino era falarmos da nossa cultura. Nós ensinávamos inglês através de workshops ou através de trabalhos de grupo e como é uma idade mais avançada já conseguíamos sessões mais interativas. Eu lembro-me de fazer sessões sobre o pensamento crítico para analisar como somos agora e como eramos à uma mão de anos atrás, o que é que mudou o que é que não mudou, quais são os nossos principais valores; demos algumas palestras também sobre o desenvolvimento sustentável, falamos muito sobre Malala, por exemplo, onde exploramos que era uma rapariga que também vinha de um país que não era tão desenvolvido e que lutou pelos direitos das crianças e das mulheres; debatíamos temas assim marcantes. E depois nós eramos pessoas vindas de muitos lados, da Tailândia, Indonésia, China, Egipto, Tunísia, Azerbaijão, Roménia, França, uma grande variedade de países. Eu quis ir sozinha, aventurar-me, foi a primeira vez que saí de Portugal sozinha para fazer uma viagem destas e foi uma das experiências em que acabei por me desenvolver muito, o meu inglês não era assim tão bom e por isso também foi uma das razões pelas quais quis ir de experiência e depois eu tinha muito que falar com outras pessoas, porque caso contrário ia ficar sozinha. Acabei por fazer várias viagens para além do sítio onde eu estava e ia sempre com um grupo diferente para também criar mais ligações. Eu também sou assim, um pouco tímida, então tentei desenvolver-me ao máximo e em todas as viagens que fiz acabei por fazer amigos diferentes e foi super engraçado e consegui perceber um bocadinho da realidade não só da Turquia como também de outros países. Sempre que nós falávamos da nossa cultura nós acabávamos por falar um bocadinho do nosso país do que achamos que está bem, do que achamos que devia mudar, os pensamentos que a sociedade tem, etc.; então foi bastante bom nós vermos estas diferenças e várias realidades diferentes. Depois também falámos muito sobre a comida, que, por exemplo, um tipo de comida na Algéria que se fazia muito quando alguém morria, mas depois na Turquia fazia se esse tipo de comida quando alguém nascia e são realidades muito diferentes e isso é engraçado de perceber. Fizemos uma dinâmica de grupo em que estava toda a gente na cidade para onde fui e nós eramos cerca de 200 pessoas de projetos diferentes, e acabamos por comer e experimentar comidas de outros países e o que para nós, um pão com marmelada por exemplo, que é super normal, um rapaz do Paquistão adorou aquilo, e mesmo o atum, as raparigas da indonésia nunca tinham comido atum e eu pensei “é só atum”, foi muito engraçado também essa parte.
Qual é que foi o maior desafio que enfrentaste ao longo dessa experiência e como o ultrapassaste?
Durante a experiência nós temos sempre muito acompanhamento da AIESEC, mesmo lá nós temos certos objetivos que a organização tem de cumprir como eles terem de nos levar ao primeiro dia de trabalho ou eles irem buscar-nos ao aeroporto ou à estação de autocarros e então foi fácil integrar-me com pessoas que só falavam inglês. Assim, o maior desafio, não sei talvez tenha sido mesmo ir sozinha e ter de me desenrascar nas pequenas coisinhas que aqui não haveria problema nenhum. Há coisas na cultura que são diferentes, mas tu acabas por te habituar, por exemplo, os sapatos não podem entrar dentro de casa têm de ficar cá fora. Mesmo a maneira como nos cumprimentamos, por exemplo, eu cheguei e ao rapaz que me foi buscar à estação de autocarro eu dei dois beijinhos e ele ficou meio atrapalhado e disse-me que ali só se dava um e eu fiquei logo a aprender. Então acho que não houve nada que me chocou, eu acho que as pessoas antes de ir pensam muito no que as outras pessoas dizem e não sabem bem a realidade. Por exemplo, os meus pais estavam cheios de medo que eu fosse para a Turquia e no início brincavam a dizer que tinha de usar as vestes típicas, e depois lá havia raparigas turcas que não as usavam e usavam calcões, vestidos, camisolas curtinhas a ver-se a barriga e então eu estava muito mais com uma mentalidade de medo, “que aquilo vai ser só gente com aquelas roupas e com a burca” mas esse pensamento foi se desconstruindo à medida que eu fui conhecendo as pessoas e a cidade e as pessoas podem usar ou não independentemente de acreditarem, isso muitas vezes não tem influência, e depois concluí que nesse aspeto era quase como estar em Portugal.
Por isso sim, eu diria que foi mesmo o ir sozinha, o estar longe da família e principalmente o ver tantas realidades diferentes ao mesmo tempo. Acho que os medos são mais antes de ir porque estamos sempre a pensar se nos acontece alguma coisa, mas depois de estar lá habituamo-nos.
O que é que achas que as pessoas ganham ao sair da sua zona de conforto e irem viver uma experiência internacional destas?
Acho que todas as experiências são diferentes e cada pessoa as vive de maneira diferente, mas no geral o que vamos fazer é sair da zona de conforto mesmo dentro da Europa porque pequenas coisas tu não estás habituada, por exemplo queres sair, mas depois não sabes se deves usar o metro ou os autocarros é um bocadinho por aí. Vou te contar uma história que podia ter sido a coisa mais normal, mas para mim era a primeira vez e no início e comecei a pôr em prática o que aprendi cá durante o tempo que estive na organização. Quando eu fui, eu tive de fazer escala em Istambul e o meu primeiro voo atrasou-se imenso, era suposto ter uma escala de uma hora e vinte e eu tive meia hora para fazer a transação de voo e, depois como o aeroporto de Istambul é muito grande o avião acabou por dar imensas voltas até estacionar, então quando eu saí literalmente a correr, tirei o bilhete perguntei a umas quantas pessoas para onde tinha de ir e as pessoas não percebiam mas lá encontrei alguém que me disse fui a correr e como temos de passar obrigatoriamente no controlo voltei a tirar computadores, máquina fotográfica, relógios e todas essas coisas antes de embarcar e mesmo assim cheguei a 10 minutos do avião levantar voo e chego ao pé da senhora junto ao embarque e digo-lhe que tenho mesmo de partir naquele avião resumi-lhe a situação e ela lá me deixou entrar e acabei por ir na primeira classe por chegar tarde. Estas pequenas coisinhas é que eu acho que te põem à prova.
Porque é que recomendarias uma experiência destas e se pudesses resumir numa frase o que estes tipos de vivências valem, o que dizias?
Se fosse uma palavra era incrível, mas isso é muito subjetivo. Na minha opinião e na minha experiência eu diria que é ver para quer, porque as pessoas têm muito uma opinião formada que nem sempre corresponde à realidade e nós vamos embalados nisso. É preciso quebrar estas ideias formadas, tanto em nós próprios como na sociedade em si, então seriam essas duas ou ver para quer ou quebrar ideias formadas.
Na minha opinião, todos, ou pelos menos os que podem, deviam fazer uma experiência destas, porque é como eu e disse, é a experiência de te pores à prova e podem dizer que quem está numa universidade longe de casa ou se for de Erasmus ou se simplesmente for viajar sozinha, isto também acontece, eu não digo que não, mas a parte social do projeto também marca muito e é isso que faz a diferença. Acho que temos de ir com um propósito, o meu foi desenvolver-me e consegui, e foi impactada pelas pessoas com quem estive, tanto com alunos como com os colegas e sei que impactei pessoas e isso é incrível. É muito o impactar e ser impactada.