Já ouvimos falar de muitos programas de voluntariado, mas nem sempre temos a coragem suficiente para fazer um desta dimensão. Gostávamos de participar, achamos a ideia interessante, mas acabamos por não ter coragem suficiente para avançar. Hoje temos connosco uma pessoa que passou da ideia à ação e rumou mais do que uma vez a um país diferente para fazer voluntariado. Queremos desde mais agradecer a disponibilidade à Juliana.

O que é que te levou a ir fazer voluntariado e se foi uma decisão instantânea e avançaste logo ou se levou o seu tempo a ser concretizada? Como é que tiveste conhecimento destes programas?

Vou começar com a minha primeira experiência que foi no verão de 2017. Foi através de uma associação portuguesa que eu encontrei na internet, que se chama “Para onde” e lá é possível encontrar tanto projetos nacionais, cá em Portugal, como internacionais, que foi o que eu escolhi. Na altura eles cobravam uma ficha de inscrição de 40 euros, no meu caso, e nós ainda tínhamos um dia de preparação para o voluntariado que eram palestras e atividades em Lisboa. Neste voluntariado internacional eu fui para a Grécia, e fui sozinha, e basicamente não tive de pagar nem estadia nem alimentação, só tive de pagar os bilhetes de avião e foi muito gratificante. No início eu estava com muito medo de ir porque era uma instituição para pessoas com deficiências mentais e eu nunca tinha tido contacto, não sabia se ia conseguir lidar com isso ou não, mas eu também não tive contacto direto com eles. Nós fazíamos atividades caso quiséssemos, mas estávamos a trabalhar mais para a infraestrutura da organização. Isto foi um trabalho pesado, mas nada que tenha ultrapassado a descrição do programa inicial, nada que não fosse esperado. Nós tivemos uma boa preparação por parte da associação, tínhamos todos os detalhes, contactos de emergência e eramos realmente bem preparados. Na verdade, eu acho que as pessoas pensam que tem de haver mais coragem para ir para um lugar desconhecido sozinha, principalmente nós mulheres, mas acreditem que não é assim tão difícil quanto pensam. Claro que é preciso haver uma preparação, ter uma segurança, ter cuidado, mas tudo é possível.

Então foi imediato?

Mais ou menos, é preciso fazer uma candidatura e seres aceite, mas sim eu candidatei-me e foi fácil. Eu queria fazer alguma coisa diferente no verão e sabia que ia estar cá em Portugal durante um mês. Não queria ficar em Coimbra no verão, então decidi ir. Eu tinha 19 anos na altura, acho eu, mas não me arrependo, foi uma experiência incrível.

Depois, no verão de 2018, eu fui para as Ilhas Canárias, mas desta vez não foi bem voluntariado foi work exchange, foi por outra plataforma, pela world packers que é um site até bastante conhecido e basicamente permite que vocês façam ou voluntariado ou work exchange não só em toda a europa como em todo o mundo. Em Work Exchange tu trabalhas em troca de estadia, eu trabalhei num hostel em Las Palmas, nas ilhas canárias, durante 5 semanas. Eu sugiro muito esta plataforma, para além de ter bastante segurança, tem contactos de emergência, vocês têm acesso a contactos de pessoas que já passaram por lá, relatos de experiências, é mesmo segura e por isso é que também me senti segura a ir sozinha.

Pegando na vez em que foste para uma comunidade ajudar pessoas com deficiência. Quando pensaste em ir fazer voluntariado já era com esse objetivo ou foi o programa ou a associação pela qual foste que te incentivou a isso?

Sim, eu já sabia o que era, fui eu que escolhi. Eu já sabia o nome da instituição e já sabia exatamente para onde eu ia, já tinha todas as informações por isso não foi uma surpresa.

Era mais para conheceres outras realidades ou para te desafiares a ti mesma?

Os dois na verdade. Eu conheci pessoas que vieram de todos os lugares do mundo, houve uma menina que veio do méxico só para fazer o voluntariado na Grécia, havia pessoas de Espanha, da República Checa, eu conheci pessoas de todo o mundo. Cada um tinha o seu motivo válido e diferente para estar lá, mas no geral foi uma experiência muito gratificante. Eu já estava à espera que fosse, mas não estava à espera que fosse tanto, e até fiquei um pouco surpreendida por me ter dado tão bem com as pessoas que estavam lá. E também porque lá, tive de falar essencialmente inglês e eu não sabia se sabia o suficiente ou se falava o fluente necessário, até que eu cheguei lá e tive que me arranjar, porque caso contrário teria de falar grego que, pronto…. Por isso também recomendo não só pela experiência de ir sozinha, apesar de também se poder ir em grupo, também há essa possibilidade, mas para treinar uma segunda língua e para veres o que és capaz.

Talvez um dos entraves que nos leva a desistir da ideia poderá ser o facto de irmos sozinhos. Nós sabemos que lá estiveste em grupo, mas ir sozinha também dá algum medo. Os teus pais foram a favor, foi fácil convencê-los?

O meu pai ficou bastante receoso, mas eu falei com ele e disse-lhe que era uma oportunidade muito boa profissionalmente porque é uma coisa que eu posso por no currículo e que permitia treinar a minha segunda língua então ele deixou mais pela parte profissional, mas no geral a experiência vai muito além do profissional.

Foi fácil comunicares com os teus colegas das duas vezes?

Sim, eu diria que as duas tiveram as suas barreiras. Na Grécia eu tinha pessoas de todo o mundo e nas ilhas canárias também contactei com muita gente e claro que nós falávamos maioritariamente em inglês, em Espanha havia a possibilidade do espanhol, mas eu sou péssima. Basicamente eu comuniquei em inglês, mas se não der inglês “a gente vai na mimica”, não é impossível a comunicação. As pessoas que vão para estas coisas já estão acostumados com voluntários de todos os lugares do mundo então a língua não é tanto uma barreira como se pode pensar.

Qual das experiências gostaste mais?

Eu acho que gostei mais da Grécia porque para a Espanha eu já tinha ido viajar e já conhecia mais ou menos. A Grécia é linda, não é preciso ir para as ilhas para perceber isso, eu fiquei numa cidade super pequenita e foi incrível. Acho que foi uma experiência que eu nunca vou esquecer.

Qual foi a situação que te deu mais medo? Sabemos que tanto antes como durante há sempre uma experiência que nos marca mais.

A experiência que eu tive mais medo não foi o primeiro voluntariado como se podia pensar, mas sim o segundo. Não antes de ir, mas assim que eu cheguei. A cidade não era bem o que eu esperava, fiquei com um pouco de receio e de medo das pessoas, mas deu tudo certo, não aconteceu nada de mal e correu tudo bem.

Quais foram os pontos mais altos da experiência e que mais gostas de recordar, ou a experiência mais engraçada que tiveste?

Olha agora nem sei bem, tenho vários. Na Grécia por exemplo, nós tínhamos duas horas de praia todos os dias, uma pausa do trabalho, e nós decidimos pegar num barco insuflável que nem sabíamos se estava a funcionar e remamos durante muito tempo para chegar a um spot que víamos de longe e parecia ser uma ilha, mas pronto não era. Uma vez fizemos isso a nado e eu quase morri afogada porque era muito longe, mais longe do que parecia. Ainda na Grécia, houve uma menina com deficiência que me puxou o cabelo, eu sempre tive o cabelo comprido, e ela puxou-me o cabelo e eu fiquei muito assustada. Mas depois eu conversei com as pessoas sobre isso e eles disseram-me que, na verdade, ela faz isso com as pessoas que ela gosta. Nas ilhas canárias o que eu mais gostei foi estar perto do mar, estava a 2/3 minutos do mar e era sempre incrível. Acho que no geral foi tudo muito marcante, não consigo pegar num momento em específico.

O que é que antes de ir achavas que não conseguias fazer e fizeste, e o que é que aprendeste com esta viagem para ti, em termos pessoais?

Eu acho que foi a convivência em grupo e colocar-me à prova também em questões físicas porque, tanto nas ilhas canárias como na Grécia, não estava no melhor ambiente possível. Nas ilhas canárias nós dormimos em colchões no chão durante 2 semanas, mas mesmo assim no geral foi uma experiência incrível. Claro que eu me pus à prova, eu não sei explicar, porque nunca tinha passado por isso, eu sempre tive o meu quarto individual, e nunca tive de partilhar um pavilhão com 12 pessoas. Também nas ilhas canárias, eu tive de compartilhar um quarto super pequeno com mais 4 pessoas, e então aí tu pões te à prova de até que ponto tu consegues viver em grupo e resolver conflitos, numa outra língua que não é a tua. De certeza que ampliou os meus horizontes mil vezes, em todos os sentidos e foi um desafio que ajudou o meu crescimento enquanto pessoa. Por isso eu também recomendo muito, principalmente se tu gostas de viajar e tens um orçamento reduzido como é o nosso caso dos estudantes.

Um conselho que queiras deixar às pessoas que vão ler a entrevista e que aches ser importante para passarmos da ideia à ação e ir numa aventura destas.

Nem sempre é assim tão fácil entrares no sítio que queres, por isso eu sugiro fazeres a candidatura para vários sítios diferentes. É uma seleção, por isso não fiques desanimada se receberes um não, porque isso não quer dizer nada. Depois, está preparado para vários desafios, tanto físicos como emocionais principalmente na convivência com grupos, como eu já tinha referido. Também em relação à segurança, é preciso ter muito cuidado, mas não é aquilo que vemos na televisão que sei lá, te vão raptar para te roubar órgãos ou assim, que inclusivamente em brincadeira as minhas amigas me disseram para ter cuidado antes de ir. Claro que é preciso ter cuidado, mas não é nada desse género. Quanto à língua não é tanto uma barreira quanto as pessoas pensam e mesmo quanto à coragem, não é preciso ter assim tanta coragem quanto as pessoas acham porque as coisas acabam por ser mais fáceis do que nós achamos, as coisas vão se encaixando.

Então é preciso é ir! Sim, claro. É preciso dar o primeiro passo e depois é tudo mais simples

Link para os sites: https://www.worldpackers.com/pt-BR
http://paraonde.org/